Mas não, o jantar foi bem agradável, com o timing correcto para à saída apanharmos chuvada a meio do caminho e ter de fazer o percurso corrido entre montras de loja e vãos de portas.
O espectáculo começou com meia hora de atraso, passada a maior parte dela no foyer, porque a sala permanecia fechada enquanto os últimos testes ou ensaios eram feitos.
Mari Boine… para quem como eu gosta particularmente da música, vibra com ela, ondula o corpo ao ritmo mesmo das melodias mais suaves, foram duas horas muito bem passadas.
Gostei de a ouvir falar, no seu inglês arrastado, da sua terra, das tradições do seu povo, que, como gosta de salientar, vem de antes do cristianismo e nas escolas não é ensinada, da beleza agreste dos locais que lhe servem de inspiração. Dos contraste entre um Verão quente e povoado de mosquitos e do Inverno com temperaturas que para nós povos mediterrâneos não têm qualquer significado concreto, de auroras boreais, de borboletas, de flores persistentes, do voo da águia…
E foi no voo da águia que eu consegui condensar tudo. Sempre, ao escuta-la, me senti transportada em voo rápido e rasante sobre paisagens imensas e ainda naturais. Imaginava que me libertava das amarras da gravidade e conseguia percorrer distâncias enormes em poucos minutos, via a textura da paisagem que se sucedia, sempre com aqueles ritmos por fundo, via povos, na aurora dos tempos, prestando homenagem à natureza que tudo guia. Acho que a música dela tem um carácter de intemporalidade que me conquista, aqueles sons, mais entoados que cantados, que nascem e ecoam sem que a boca praticamente se mova, conseguem ser acompanhados quer pelo silvo do vento e restolhar das arvores, quer pelos sons sintetizados de uma guitarra eléctrica.
Gostei de escutar, sozinhos em palco, uma flauta e uma guitarra que chorava como um violino.
Mari Boine tem ainda um significado especial para mim, descobri a sua música num momento da minha vida em que tive de fazer escolhas, continuar a ser quem me tinha tornado, ou tudo questionar e renascer. Por isso, para além do voo da águia, na sua música, sinto o voo da Fénix em que me tornei nessa altura.
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